Foto: Renan Mattos (Diário)
Foi por meio do slogan Pelo direito de sentir, difundido por um grupo de famílias que já perderam seus filhos, que Santa Maria entrou na roda das discussões da Semana Gaúcha de Luto Parental. Pudera. O histórico de perdas na cidade da maior tragédia do Estado, cuja ferida da boate Kiss ainda sangra nos pais daqueles 242 jovens que perderam a vida em 27 de janeiro de 2013, justifica-se. Juntam-se ao grupo - e não com menos motivos de sentir -, mães vítimas de violência obstétrica e famílias que perderam seus entes em crimes e acidentes.
Por esse motivo, um grupo se reuniu no auditório da antiga reitoria da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no final da tarde da última segunda-feira. O encontro foi o início de uma rede de apoio entre a organizadora do evento, a ONG Amada Helena, de Porto Alegre; o grupo Mulher, Apoio, Empoderamento e Saúde (M.A.E.S), Associação dos Familiares de vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), pais de Isadora Viana Costa e o coletivo Amor, Movimento e Dança (AMD). O objetivo também é fazer com que os relatos e as trocas de experiências fomentem pesquisas sobre o assunto na UFSM.
As conversas contaram com a antropóloga Monalisa Dias, que falou sobre como as emoções e a dor afetam as relações sociais; com a doutora em Educação Maria Py Dutra e a psicóloga Daniela da Silva dos Santos, que discorreram sobre o sofrimento psíquico de mulheres negras.
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- As pessoas não têm o hábito de falar sobre a morte e, tampouco, escutar quem tem a necessidade de falar. Os depoimentos (de segunda-feira) foram muito fortes. Quando um filho nasce, é teu coração batendo fora do peito. Nunca mais seremos as mesmas. E não somos mais a mesma quando perdemos eles. O encontro foi um grande passo para o luto parental. Seja a forma da perda que for: gestacional, poucos dias de vida ou com qualquer idade, é perda. Pois filho é filho, e isso ninguém nunca vai mudar - relatou Ligiane Righi da Silva, mãe de Andrielle Righi da Silva, 22 anos, que morreu no incêndio da boate da Kiss.
Para a representante da rede em Santa Maria, a professora Bruna Fani Duarte, 25 anos, o momento é de transformar a dor em ações solidárias.
- O que me levou a este movimento foi ter visto minha mãe devastada pela perda do meu irmão, há 10 anos, em um acidente de carro, no Dia das Mães. Após ter vivido esta cena, na Kiss, vendo as famílias se devastarem, senti isso na pele. Quando chegou em mim, eu queria transformar isso em outra coisa. Assim começou o movimento contra violência obstétrica e foi assim que conheci a Tatiana Maffini, presidente da ONG Amada Helena, idealizadora do projeto no Estado - conta Bruna.
A AÇÃO
Julho é o Mês Internacional dos Pais Enlutados. A iniciativa no Brasil começou pelo Rio Grande do Sul, com a Semana Gaúcha de Luto Parental. Em Porto Alegre, a proposta é que a semana seja transformada em lei. Em âmbito nacional, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 978/19 prevê medidas para humanizar luto materno. No Canadá, nos Estados Unidos e em diversos países da Europa, já há estudos avançados, iniciativas e associações sobre o tema.